Em um certo bate-papo de café da manhã, eu contava com empolgação para os meus filhos sobre vários assuntos curiosos que ouvi no dia anterior, em minha aula de cultura e antropologia alimentar. Um tópico em especial ganhou a atenção dos meninos: sobre existir uma ilha cujos moradores jamais compartilham uma refeição, nunca comem em público, mas se alimentam somente se estiverem sozinhos! Suas conclusões muito próprias surgiram espontaneamente: "Eu não ia querer viver nesse país". “Nem eu”.
Durante o jantar do dia seguinte, o caçula surpreendeu: “Eu gosto muito de comer com vocês!” Então o provoquei a continuar: “E eu AMO comer com vocês! Mas por que você está dizendo isso?”. “Porque você falou que existe um lugar em que as pessoas só comem sozinhas, deve ser muito triste!”. O irmão, por sua vez, perguntou se existia uma lei naquele lugar que proíbe as pessoas de comerem juntas. Imagine! Na cabeça de uma criança de 7 anos, só uma norma poderia impedir alguém de fazer algo que para nossa família é natural e tão prazeroso! Expliquei brevemente sobre cultura e tradições. Mas falamos mais sobre as razões pelas quais gostamos tanto de estar à mesa juntos. É quando mais temos oportunidade de conversar sobre assuntos diversos, de expressar nossos valores ou opiniões, de fazermos reconhecimentos positivos sobre o outro, de darmos boas gargalhadas.
A querida e saudosa escritora Devi Titus - que nos deixou um legado através do seu livro A experiência da mesa - trouxe um importante alerta através do texto bíblico:
“Apanhai-me as raposas, as raposinhas que devastam os vinhedos, porque as nossas vinhas estão em flor”. Cantares2.15
Um tipo de raposinha muito comum que ameaça o florescer da nossa vida em família é a ocupação excessiva de seus membros, que destrói o tempo de qualidade juntos. Mesmo as tarefas lícitas e importantes como o trabalho fora de casa ou até na igreja! Se estas nos impedirem de priorizar o evento mais significativo da vida familiar para o desenvolvimento emocional dos filhos, que é a refeição compartilhada, teremos nossa vinha da conexão emocional abalada gradativamente.
Especialistas da área de psicologia apontam que a comunicação é o principal ingrediente da refeição em família e, portanto, uma chave para criar filhos emocionalmente saudáveis. Um estudo acadêmico americano comprovou que adolescentes que comem frequentemente com a família – sem ao menos importar o que estão comendo – apresentam melhores hábitos alimentares em geral, menor risco de uso de drogas, melhor desenvolvimento emocional. Tratam-se de benefícios que vão bem além de se alimentar e nutrir o corpo. Nutrem os vínculos!
Queridas mães que não têm se assentado à mesa com seus filhos – que por algum motivo servem suas refeições em horários diferentes ou não estão em casa nesses momentos – é possível pensar num ponto de equilíbrio? Quem sabe uma refeição por dia? Ou ainda, é possível garantir que nos finais de semana a família se alimente nos mesmos horários?
Sugiro separar um dia específico por semana para um almoço ou jantar afetivo, seguido de jogos em família. Isso fará com que a criança tenha expectativa, tanto pela refeição que será compartilhada, quanto para o “pós-mesa”, um verdadeiro bônus que dará sequência ao tempo de qualidade juntos. Tenha um livro inspirador com ideias de passatempos e dinâmicas para essa finalidade. Uma das atividades mais marcantes que já fizemos, foi escrever breves cartões com elogios para cada membro da família. Depois de uma leitura emocionada, prometemos uns aos outros que guardaríamos aqueles cartões para sempre!
Comer juntos é tão importante para tantas trocas, para afirmação dos nossos valores e do nosso exemplo! Então, por que deixarmos nossas crianças comerem sozinhas?
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